30/3/2011
Maior competitividade dos EUA em carnes é trunfo do JBS

Países emergentes como o Brasil encontraram na última década um espaço importante para crescer no mercado externo com suas exportações de carnes, mas um concorrente de peso, os Estados Unidos, tenderá a ganhar competitividade internacional no setor nos próximos anos em função de um dólar desvalorizado frente a outras moedas.

A avaliação foi feita por Wesley Mendonça Batista, presidente da JBS, a maior empresa global de carne bovina e a segunda em carne de frango, que tem hoje nos EUA grande parte do seu faturamento.

Se o dólar é um fator a ser enfrentado pelas companhias exportadoras da América do Sul, beneficiará ironicamente a unidade norte-americana da empresa brasileira, que nos últimos anos encontrou ótimas oportunidades no mercado dos EUA e lá adquiriu dezenas de unidades de processamento de carnes, crescendo justamente a partir de uma base sul-americana.

"Com o tamanho do déficit americano, o dólar vai continuar enfraquecido comparado com outras moedas por muito tempo... Hoje nos Estados Unidos está tendo uma mudança substancial do ponto de vista da competitividade. Os Estados Unidos, nos próximos dez, vinte anos, vão voltar a competir com os emergentes ao redor do mundo em produção de commodities em todas essas áreas", afirmou Batista, em entrevista ao Reuters Latin American Investment Summit.

As exportações de todo o JBS em 2010 atingiram 8,5 bilhões de dólares, tendo a China, o México, o Japão, a Rússia e a União Europeia como os principais compradores, de um total que supera cem nações. Com as unidades dos EUA, o JBS acessa países que não importam a carne brasileira, como Japão e Coreia, que ainda pagam mais pelo produto bovino.

Mas com a carne norte-americana ganhando competitividade a vida de empresas sul-americanas, incluindo do Brasil e da Argentina, possivelmente ficará mais difícil em grandes mercados, como a Rússia, que importa dos principais fornecedores.

Os mercados domésticos onde o JBS atua, especialmente o dos EUA, também são outra aposta da companhia, num momento em que o seu presidente acredita em uma retomada econômica norte-americana mais forte do que se imagina -os EUA são os maiores produtores e consumidores de carne bovina e de frango.

Embora a empresa conte com importantes atividades no Mercosul -de onde veio quase 25 por cento da receita líquida total de 55 bilhões de reais em 2010-, a operação nos EUA, que inclui unidades na Austrália, é fonte de todo o restante do faturamento, ou de um montante que superou 40 bilhões de reais no ano passado.

A expectativa com os EUA é grande, mas a empresa ainda aguarda o melhor momento para fazer uma oferta pública de ações da divisão naquele país, após ter suspendido o processo junto ao regulador de mercado norte-americano (SEC) no início do ano, por questões burocráticas e para evitar custos adicionais com a expiração do prazo, disse Batista, de 40 anos, com mais da metade da vida profissional dedicada aos negócios da família.

"A JBS não deixou de ter o interesse (no IPO)", afirmou Batista, que conhece como poucos a divisão norte-americana, pois antes de assumir a presidência global do JBS, em fevereiro, substituindo o irmão Joesley, ele comandou durante quatro anos a consolidação e a integração das unidades adquiridas nos EUA -entre elas a Swift, Smithfield Beef, os confinamentos da Five Rivers, além da Pilgrims Pride.

"É questão de mercado... A gente acha que o enfraquecimento do dólar perante as moedas está pondo os Estados Unidos muito mais competitivos, e na nossa opinião o mercado não precificou isso", completou ele, acrescentando não ter ideia de quando será o momento adequado para o IPO.

O processo do IPO está previsto em um acordo que o JBS tem para a conversão de 3,5 bilhões de reais em debêntures, subscritas em sua maioria pelo BNDES, em ações da unidade dos EUA na eventual oferta pública. Agora o frigorífico negocia com o banco de desenvolvimento uma eventual prorrogação do prazo para a realização do IPO nos EUA, que se encerra ao final de 2011, ou uma possível conversão no Brasil, limitou-se a dizer Batista.

FERRARI ARGENTINA

Se está eufórico com os EUA, Batista disse que persiste o descontentamento com as operações na Argentina, onde a empresa mantém quatro de suas seis plantas com as atividades suspensas -as que operam fornecem para o mercado interno.

"A operação está péssima faz dois anos. A política do governo para controlar a inflação proibindo exportações tem prejudicado imensamente o negócio. Mas é o que é. Então fizemos algumas medidas, fechamos fábricas para nos manter, estamos lá suando para nos salvar. Qual o lado menos ruim? É que representa pouco dentro do nosso negócio", disse ele, refutando rumores de que o JBS teria colocado as operações argentinas à venda.

Ao comentar que também não teria havido interesse de compra, o empresário ressaltou que a Argentina, em termos de produção matérias-primas e proteínas animais, é uma "Ferrari", mas que necessita de melhores pilotos, afirmou, citando comentário originalmente feito pelo bilionário Eike Batista, que não é seu parente.

Para o JBS, a plataforma de produção argentina é vista como estratégica pela sua capacidade de oferecer valor agregado no futuro, considerando a qualidade da carne, reconhecida mundialmente.

O JBS Mercosul inclui ainda unidades no Paraguai e Uruguai, mas é do Brasil que vem a maior parte da receita, que somou 13,3 bilhões de reais em 2010.

Sobre o Brasil, após ver um aumento no custo do gado no ano passado, Batista disse que a empresa prevê uma melhora na oferta de animais prontos para o abate entre 2011 e 2012.

Ele lembrou que há três anos os pecuaristas começaram a reter mais fêmeas, em vez de abatê-las, como ocorreu há cinco anos, o que resultará em uma melhor situação de matéria-prima para o frigorífico no país, onde a empresa pode elevar a produção sem necessidade de novas aquisições, após a incorporação do gigante Bertin, há pouco mais de um ano.

"No Brasil, rodamos com 70 a 75 por cento (da capacidade instalada). Aqui podemos crescer muito usando os mesmo ativos que temos", disse, ponderando que nos EUA a empresa já utiliza até 95 por cento de sua capacidade.

O POTENCIAL DO FRANGO

Da mesma forma que a entrada no mercado norte-americano foi um marco para o JBS, uma empresa fundada a partir de um pequeno abatedouro há quase 60 anos pelo patriarca José Batista Sobrinho, no embalo da fundação de Brasília, o ingresso do grupo no setor de carne de frango, com a Pilgrim's Pride, preparou a companhia para atuar com o que muitos consideram a proteína animal do futuro, por apresentar maiores facilidades para a expansão da produção em meio à demanda crescente.

O próprio presidente da empresa, que começou e cresceu com foco em bovinos, admite que há uma "inabilidade" de aumentar a produção global de bois e vacas, uma situação semelhante enfrentada pelo setor de suínos.

"E aí é o lado positivo para aves, é a única carne que tem maior elasticidade pra produzir mais rápido, ocupa menos espaço, é um processo integrado", afirmou ele, em entrevista realizada no escritório da Thomson Reuters, em São Paulo.

Além do mais, ele vê maiores condições, com o frango, de se repassar para a carne os crescentes custos das matérias-primas, como o milho.

"Porque a demanda no mundo é crescente e a produção (de proteínas) não é crescente, a gente acha que o frango vai ser capaz de repassar esse incremento nos custos de grãos para o produto final."

Ele prevê que o milho no mercado dos EUA se sustente, nos próximos 12 meses, nos elevados patamares de 6 a 8 dólares por bushel. "Achamos que esse é o novo patamar de preço no mundo", pelo forte crescimento do consumo de alimentos nos países emergentes, disse.

AQUISIÇÃO DE VALOR AGREGADO

Para ficar menos sujeito a produtos relacionados diretamente a oscilação dos preços de commodities, o JBS busca formas de agregar valor aos seus produtos, possivelmente por meio de alguma aquisição.

E foi também nos EUA que o JBS -embora negue oficialmente- tentou a última investida nessa área, buscando comprar no início do ano a Sara Lee, uma gigante do varejo norte-americano de bebidas e carnes processadas com perfil que se enquadra bem no que os Batistas admitem buscar no futuro.

"(Neste ano) Estaremos 100 por cento focados em crescimento orgânico, em otimizar o nosso capital investido... Mas caso apareça oportunidade no mercado para crescimento, através de aquisição de alguma empresa de valor agregado, produtos de valor agregado, marca e com uma base de distribuição bastante consolidada, esse é o tipo de negócio que pode interessar ao JBS", declarou Batista, o quarto dos seis irmãos da família.

Mas para a tranquilidade de sua mãe, Flora, que não consegue entender a sanha de crescimento do JBS, e também para o alívio de alguns investidores, o presidente do grupo disse que não está, no momento, buscando tal empresa.

"Amanhã, se aparecer alguma empresa que estrategicamente tenha essas características no mercado que a gente opera, vamos olhar sim", ponderou, frisando que a hora é de "entregar um retorno adequado ao acionista", uma diretriz que visa fortalecer as ações do frigorífico, que se encontram perto dos menores patamares já negociados.

REEQUILÍBRIO DA DÍVIDA

A dívida líquida atingiu 11,5 bilhões de reais ao final do ano passado, ou três vezes o Ebitda. Para Batista, esse valor não é um problema, considerando que dois terços são de longo prazo.

"Temos 2,4 bilhões de dólares em caixa hoje, e temos 500 milhões de dólares de linhas de crédito disponíveis, estamos super tranqüilos do ponto de vista financeiro... O caixa mais a disponibilidade (de crédito) é o valor de toda a dívida de curto prazo, então não temos necessidade de reestruturar a dívida."

Mas ele afirmou que é necessário equilibrar a dívida entre as operações dos EUA e do Brasil, para uma maior eficiência fiscal.

"Porque a dívida está concentrada em sua grande maioria no Brasil. E o Brasil é onde temos 'goodwill' pra ser amortizado, e temos 9 bilhões de 'goodwill' pra ser amortizado. E praticamente não temos dívida na operação americana. Não temos goodwill... nada disso na operação americana pra amortizar, então todo o resultado lá estamos pagando 35 por cento de imposto de renda na veia", comentou, informando que se o JBS USA carregasse dívida a companhia poderia reduzir a taxa do imposto.

Uma das formas de fazer isso seria transferir os débitos para os EUA, por meio de instituições que atuam nos dois países, ou tomar dívidas lá e quitar o passivo no Brasil, disse Batista, que ainda avalia os impactos fiscais da eventual operação, com o JBS cada vez mais fincando posição em terras norte-americanas.

Fonte: Portal Beef World

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