16/9/2008
SP: crise ainda afeta pouco o agronegócio

Saída dos fundos de investimento do mercado derrubou os preços, mas estoque ainda é pequeno e demanda continua. Retomada da valorização do dólar no Brasil eleva a rentabilidade no campo e recoloca as fronteiras agrícolas na produção.

São Paulo/SP
A crise financeira que abala o mercado norte-americano terá pouca influência sobre o agronegócio brasileiro. É o que acreditam alguns analistas. Outros afirmam que é cedo para uma análise das conseqüências.

Em uma coisa analistas e produtores concordam: a alta do dólar em relação ao real dará novo fôlego ao agronegócio, principalmente porque esse setor depende das exportações.

"Essa crise internacional vai passar ao largo da agroindústria brasileira, comparada a outros setores." A afirmação é de Victor Abou Nehmi Filho, gerente da Sparta, administradora de fundos de investimento. "A maré vai continuar favorável às commodities, embora ainda não seja possível fazer muita festa", afirma.

A análise de Nehmi se baseia em duas pontas. No que se refere aos grãos, os estoques continuam baixos e a demanda dos países emergentes vai continuar. Portanto, mesmo com a recente saída dos fundos de investimento do mercado -o que derrubou os preços das commodities-, ele acredita em uma parcial recuperação.

Os preços não voltam aos picos atingidos, mas ficam em patamares intermediários: US$ 6 por bushel de milho (25,4 quilos) e US$ 12,50 por bushel de soja (27,2 quilos).

Já as commodities de consumo de países ricos, como suco de laranja, café e açúcar, podem sofrer maior influência dessa crise financeira, principalmente se ela gerar queda de renda. O Brasil lidera as exportações desses produtos.

Preocupado
Já Fernando Muraro, da Agência Rural, de Curitiba, está preocupado. Dos três itens que seguravam os preços elevados no primeiro semestre, um já deixou de dar esse suporte: os fundos de investimento.

Os estoques se mantêm baixos, mas ainda há dúvidas sobre o que vai acontecer com a renda. O agronegócio brasileiro precisa ficar de olho na economia asiática, diz Muraro.

O comércio mundial, que girava com taxa de alta de 15% ao ano, já está em 12%. "É preciso toda a atenção, também, ao consumo dos países ricos." Se a demanda cai nos EUA, afeta o crescimento da Ásia e reduz a renda por lá, diminuindo a procura por commodities.

A crise internacional está provocando uma elevação interna do dólar e uma queda nos preços internacionais do petróleo. Haroldo Galassini, presidente da Coamo Agroindustrial Cooperativa, diz que, se concretizada, essa tendência pode trazer alívio a médio prazo para os produtores.

Já a alta externa do dólar, que eleva os preços mundiais das commodities, pode ter um efeito limitado. Galassini lembra que grande parte das transações com a Europa é feita em euro, que está em queda em relação ao dólar.

Nehmi concorda com Galassini e diz que, quanto maior a subida do dólar no mercado interno, maior é a remuneração do produtor. "Os custos dos produtores são em reais e o faturamento, em dólar." A questão é até quando o governo vai deixar o dólar subir, diz Nehmi. Para segurar os custos de inflação, ele acredita que o governo colocará R$ 2,10 como limite.

Muraro diz que agricultura é câmbio e foi a valorização do real que provocou a crise agrícola. Agora, a valorização da moeda dos EUA, se concretizada, elevará a renda no campo. Estudos da AgRural, da qual é analista, indicam que, com o dólar a R$ 1,60, a rentabilidade dos produtores de soja seria de 6% na safra 2008/9 em Mato Grosso. Com o dólar a R$ 1,80, a rentabilidade sobe para 25%.

No Paraná, o dólar a R$ 1,60 gera rentabilidade de 40%. A R$ 1,80, o ganho vai a 59%.

Um dos efeitos da queda do real será a recolocação das fronteiras agrícolas no processo produtivo. A rentabilidade maior na produção compensará os altos custos de logística.


Mauro Zafalon



Fonte: Folha de São Paulo

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